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Capa do livro

Livro "Manual de Xadrez", de Idel Becker

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Resenha do livro introdutório sobre xadrez de Idel Becker

Neste post, farei uma resenha do livro Manual de Xadrez, do médico e enxadrista Dr. Idel Becker. Curiosamente, outro clássico da literatura brasileira sobre xadrez (o Xadrez Básico, sobre o qual já escrevi no meu blog) também foi escrito por um médico e enxadrista.

O Manual de Xadrez, da Editora Nobel, com 316 páginas, começa com generalidades sobre o jogo, passando pela arrumação inicial das peças no tabuleiro, os movimentos e capturas de cada uma, os movimentos extraordinários (roque pequeno e grande, promoção de peão e captura en passant), os significados de xeque e de xeque-mate e os casos de empate. Essas são todas as regras que alguém precisa saber para começar a jogar xadrez e, por esse motivo, o livro pode servir como primeira leitura sobre o assunto.

Antes de prosseguir e aprofundar, o autor descreve as fases de uma partida de xadrez e propõe uma sequência didática de estudo. As fases são a abertura, o meio jogo e o final. A abertura consiste nos primeiros lances, nos quais alguns peões são movimentados para que as peças sejam desalojadas, o centro é controlado e o roque é realizado para manter o rei em segurança e conectar as torres. Atualmente, não se inventam aberturas, pois todas, mesmo as exóticas e as consideradas ruins, já foram catalogadas; portanto, é só na fase seguinte, o meio jogo, que cada partida assume um aspecto próprio e individual. Cada jogador elabora um plano, que pode ser a coordenação das peças para a ofensiva ou a realização de trocas de peças para conduzir a partida a um final vencedor. Os finais, por sua vez, são posições simplificadas, caracterizadas pela atividade crescente do rei e dos peões remanescentes, que lutam para atingir a promoção e decidir a partida.

Becker esclarece que o estudo do xadrez não deve seguir a ordem abertura, meio jogo e final, embora, a princípio, esta pareça ser uma sequência lógica. Isso porque a abertura tem a considerar todas as peças, já que, supostamente, ainda nenhuma troca foi realizada, o que corre o risco de sobrecarregar o estudante; e o meio jogo pode se desdobrar de infinitas maneiras, dependendo dos planos estabelecidos pelas brancas e pelas pretas, o que também torna seu estudo precipitado para os iniciantes. Em vez disso, o estudo deve partir do mais simples, os finais elementares, em direção ao mais complicado: noções de estratégia, sinopse das aberturas mais usuais, noções sobre o meio jogo e finais mais frequentes.

Após essas considerações, o autor aborda os finais elementares, aqueles em que um dos lados possui apenas o rei, enquanto o outro deve possuir, no mínimo, uma dama, uma torre, dois bispos ou um bispo e um cavalo (além, obviamente, do rei) para forçar o xeque-mate. O livro então passa a ensinar como aplicar cada um desses mates. Ganha destaque a abordagem dada aos finais de rei, bispo e cavalo contra rei, que segue o Método dos Triângulos de Delétang e Cognet.

Em seguida, são abordados finais de rei e peão contra rei, incluindo o conceito de oposição, e exemplos são fornecidos, acompanhados por diagramas e utilizando a notação descritiva.

A obra segue cobrindo a sequência de estudo proposta anteriormente, com princípios gerais sobre estratégia, descritos como “postulados prévios para a vitória”, entre os quais: ter sempre uma ideia clara por trás de cada lance; colocar as peças em ação rapidamente, evitando perdas de tempo com lances desnecessários ou repetidos; controlar o centro da tabuleiro; manter uma estrutura de peões saudável, controlando casas importantes (sobretudo as centrais), evitando avanços comprometedores e peões dobrados (na mesma coluna), isolados (sem companheiros nas colunas adjacentes) ou atrasados (um peão está atrasado quando ele está bloqueado, seus companheiros nas colunas adjacentes já avançaram e não podem protegê-lo); ganhar espaço, principalmente antes de atacar, desenvolvendo peças para que elas controlem colunas, filas e diagonais; evitar trocas desnecessárias de peças, especialmente as trocas de uma peça desenvolvida por uma não desenvolvida do adversário, mas avaliar trocar na situação oposta; sempre cuidar da segurança do rei, fazendo roque na abertura, de preferência do mesmo lado que o adversário, para dificultar ataques, e ativar o rei no final. Esses conselhos podem ser estudados em pouco tempo pelos recém enxadristas, servindo-lhes como orientação desde as primeiras partidas.

Na continuação, o autor dá início ao estudo das aberturas. Algumas variantes são comentadas. Entretanto, muitas aberturas importantes ficam de fora, o que é um ponto negativo.

A parte seguinte do livro, dedicada ao meio jogo, constitui-se basicamente de partidas de mestres comentadas.

No estudo do final de jogo, o Dr. Becker, citando o argentino Roberto Grau, diagnostica a dificuldade dos amadores com a abertura e com o meio jogo — o que muitas vezes leva à derrota ainda numa dessas fases, sem chegar no final — como a causa do negligenciamento do estudo de finais observado entre muitos desses enxadristas, mas salienta a importância desse estudo, apresentando-o como o momento culminante de beleza e dificuldade do xadrez, no qual o bom aproveitamento dos lances torna-se ainda mais crucial, assim como a necessidade de um plano único, preciso e satisfatório a ser seguido. O capítulo cobre os finais de torre e a clássica posição de Philidor.

No restante do livro (mais da metade) encontram-se numerosas partidas de mestres comentadas; mais adiante, um capítulo sobre problemas, no qual destaca-se um pequeno dicionário com termos relativos a esse universo e uma proposta de classificação de problemas.

Finalmente, no capítulo “Miscelânea”, encontram-se fatos históricos sobre o xadrez, curiosidades e anedotas. É um capítulo muito divertido e que aumenta a vontade de estudar.

Comparando o Manual de Xadrez com o Xadrez Básico, pode-se dizer que ambos servem como introdução à literatura sobre xadrez e atingem aproximadamente o mesmo nível de profundidade. Algumas diferenças são: o Xadrez Básico cobre uma variedade maior de aberturas e aprofunda mais o capítulo sobre finais, enquanto o Manual de Xadrez é mais interessante quando se trata de problemas e apresenta um número maior de fatos históricos e curiosidades para estimular os estudantes.